segunda-feira, 27 de fevereiro de 2006

Alô bateria...

Eu tenho uma relação estranha com o carnaval.
Até sábado passado, eu tinha dúvidas sérias se eu realmente gostava de pular carnaval ou se preferia pular o carnaval. Mas acho que era por pura preguiça de pensar, refletir e estabalecer uma posição definitiva.

Aos 5 anos eu ganhei um concurso de fantasia na minha praia. Por unanimidade. A fantasia era de "Dama Antiga" (ou damatíga, como eu dizia), lilás. Lindíssima. Meu pai fez uma faixa de incentivo e foi pra torcida com o resto da família.
Dos 5 aos 17 eu pulei carnaval na SAAS (sociedade dos amigos de arroio do sal) e eu esperava o veraneio inteiro por esses 4 dias. Mas eu sempre fui meio reservada. Sempre tive escrúpulos e limites. Limites pra mim e pros outros. Xingava muito, batia boca e, por vezes, esbofeteava um ou outro engraçadinho que resolvia achar que a minha bunda era um local público. Fui retirada do clube por seguranças algumas vezes, mas sempre voltava depois de esclarecer o barraco. Eu nunca beijei 15 numa noite só. Nem nas 4 noites de carnaval inteiras. Nem num verão inteiro. Nunca achei isso muito legal.
Daí, minhas amigas começaram a se desvirtuar e usar saias e shorts cada vez mais curtos e apertados durante o carnaval. Achavam legal usar anéis de latinhas de refri/cerveja penduradas numa corrente, com o número correspondente a quantos "pegaram" durante o carnaval.
E as fantasias se resumiram a um colarzinho chinelão de "havaiana". Bebiam até vomitar e acabavam na calçada antes de começar o baile. Eu ficava PUTA da cara.
Eu resolvi parar de ir no clube. Fui pra avenida.
(esse ano teve um lamentável "carnafunk" no mesmo clube...triste. MUITO triste).

Enfim...alguns carnavais irrelevantes, outro em Houston e outro num bar alternativo em Garopaba dançando músicas dos anos 80 (esse foi divertidíssimo e inesquecível, apesar de não ter tido bateria).

Esse ano, descobri que a minha escola do coração acabou. Era escola de marisqueiros, eles não tinham grana, mas tinham uma bateria que nunca recebeu nota menor do que 10. Eram apaixonados.
Deu uma dor no peito. Mas tratei logo de agilizar uns contatos e procurei um outro lugar pra desfilar. Meio assim, de última hora.
Desfilei numa outra escola: de pés descalços na avenida principal, na ala que homenageou o teatro grego, num enredo que falava de arte.

E, enfim, descobri o que me faz ser apaixonada por esses dias em que todo mundo finge que o país não tem problemas: eu gosto de carnaval na rua. De desfilar na avenida, de gente aplaudindo, de plumas e paetês, de purpurina, de 300 pessoas cantando o mesmo samba-enredo, da bateria. Da bateria, principalmente.

Eu não tenho vergonha de dizer que eu choro e me arrepio quando a bateria começa a tocar.
Eu tenho o maior orgulho da minha brasileirice genuína*, que aflora quando o cara lá em cima do carro de som anuncia que " a hora é eeeeessaaaa!" e "vamulá minha bateria!"


*(eu não tenho ascendentes em lugar nenhum do mundo. devo ser fruto de um caso banal entre um português e uma índia, ou algo assim...essas relações estranhas que originaram a maior parte do povo brasileiro...nunca vou ter dupla cidadania, embora isso fosse bem útil no atual momento).

Só que eu ainda me sinto deslocada, de certa forma.
Porque eu desfilo e vou embora.
Eu não gosto do clima de "pode tudo" que se cria. Eu odeio, ODEIO sprays de espuma.
Eu acho muita chutação de balde um bando de gurias usando camisetas com o logotipo da Whiskas, escrito "comida para gatos".
Eu acho asqueroso gurias desfilando de maria chiquinha e chupeta de nenê na boca com 20 anos na cara.
Eu acho nojento os caras que bebem - e os que não bebem- que chegam agarrando qualquer uma só pq. "é carnaval ôlelê!!!!" E depois usam isso como "desculpa".
Eu acho que falta respeito (próprio, inclusive) e sobra mau gosto.

Eu curto o carnaval sozinha, durante os 60 minutos de desfile e depois vou pra casa dormir.

Quando eu tiver dinheiro de sobra, eu vou desfilar no Rio.

Ano que vem, sairei de destaque lá em Arroio do Sal mesmo. É o primeiro (e estratégico) passo pra ganhar a frente da bateria. Me aguardem.

3 comentários:

Anônimo disse...

mazá!
eu não sabia que tu sambava...

Anônimo disse...

não tem foto do desfile?

Anônimo disse...

arrepiante teu texto. passei um carnaval lá na gringolândia, quando tinha 14 anos. eu e dois amigos acampados num camping das proximidades. foi bem divertido. legal aquela prainha e o carnaval de rua de lá.