terça-feira, 2 de dezembro de 2008

mari sofistinha

eu tenho um paciente filósofo. não, não é força de expressão, ele tá fazendo até mestrado na pucrs e durante as sessões, enquanto eu corrijo o sotaque, algumas palavras ainda inadequadas, a oratória e a articulação dele, ele me dá aulas de filosofia.


eu tou adorando. sabe como é geminiano, se intressa por todos os assuntos existentes no mundo: da astrologia ao calendário maia, ao sistema de cotas, política econômica da coréia do sul, fofocas de famosos, futebol, artes cênicas, desfiles de moda, novidades hi-tech, pinturas renascentistas, e cinema.


no fundo, eu sempre gostei de filosofia. era aplicadíssima nas aulas do segundo grau e até hoje tenho na memória frases impactantes do tipo: "o ser é. o não ser não é. porque se o não ser fosse, o ser nada seria." genial. eu assisti uma aula todinha sobre a dialética e me lembro que existe uma tese, uma antítese e uma síntese.


mas enfim. o meu paciente tá, novamente me despertando esse interesse adormecido. resgatei o livro que eu usei no colégio e de vez em quando busco textos ali pra discutir com ele.


esses dias, falamos dos sofistas. pra quem não sabe, os sofistas foram os primeiros filósofos do período socrático. quando o cara me falou deles, na hora me identifiquei. não exatamente com o rótulo de "charlatães" que eles carregam, mas sim com o poder de argumentar e persuadir pessoas. os sofistas tinham a manha da oratória e convenciam uma galera sobre coisas que, muitas vezes, eram consideradas sem importância. eles foram extremamente criticados, logicamente, já que iam de encontro a tudo o que a filosofia prega. eles eram os reis do discurso vazio. foram também, considerados os primeiros advogados.


so que, claro: quando meu paciente falou dos sofistas eu fiquei na minha. na saída, ficou a pergunta do tema de casa: "mariana, pensa sobre o que tu considera verdade absoluta". eu falei: "ah, isso depende" e antes que eu iniciasse um discurso inventado na hora sobre a verdade, ele me interrompeu e riu: "bah, que baita sofista tu é."


eu acho que se eu tivesse que escolher outra profissão, eu entraria pra política ou seria atriz. ou pastora de igreja evangélica. não sei, escolheria qualquer coisa que me permitisse inventar, aumentar, distorcer, persuadir, inverter, argumentar, contra-argumentar, confundir... é muito difícil pra uma sofista moderna trabalhar com crianças e na área da saúde onde, como manda a ética, uma única verdade deve reinar absoluta. não posso inventar, por exemplo, que um nódulo de prega vocal é um cisto ou que um "r" pode, sim, se passar por "l" ou que deficiência auditiva é uma questão de ponto de vista.


acho que tá explicado o motivo de eu ser apaixonada por teatro e ter feito aquele curso no TEPA. deve explicar também o fato de eu ter feito meu tcc com atores de teatro. e deve ser por isso também que desde pequena eu fui tachada de chata (odiava quando me respondiam "nada" quando eu perguntava o que tinha antes de surgir o universo) e teimosa (porque eu sempre argumentava até quando levava chinelada na bunda).

eu sempre fui uma sofista incompreendida, isso sim.

Um comentário:

Anônimo disse...

"convenciam uma galera"

(mijjjjjjjjjjjjjjjjando de rir)

dá-lhe academia!

mas tá bão, tá bão... tem coisas bem heideggerianas e sartrenianas no teu texto. nada que "o ser e o nada" e "o ser e o tempo" não melhorem o "convencer uma galera"

:)

tu daria uma excelente sofista, sem dúvida.

:*